domingo, 9 de agosto de 2009

Terra da Gente Especial Serra da Bodoquena - Biodiversidade nas Águas e no Ar

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Bonito, no Mato Grosso do Sul, abriga uma variedade imensa de aves e peixes, numa paisagem surpreendente.

A maior riqueza natural de Bonito está debaixo d'água. Imensos cardumes de peixes encantam visitantes do mundo inteiro. Os ecoturistas, porém, costumam olhar tanto pra baixo que, muitas vezes, se esquecem de contemplar as belezas que existem na direção oposta. No alto das árvores, um mosaico vivo de cores. Diferentes espécies revelam uma beleza ainda pouco explorada pelos observadores de aves nesta região do Mato Grosso do Sul, próxima à fronteira com o Paraguai. É um planalto que se estende por 300 quilômetros, também conhecido como Serra da Bodoquena. Uma área que abrange os municípios de Jardim, Bonito e Bodoquena. Um lugar com moradores que chamam a atenção. Em alguns casos, a beleza está num detalhe, seja nos olhos do choró-boi, ou no rabo do surucuá-de barriga-vermelha. Às vezes, a ave parece não ter nada de especial, até você descobrir o nome dela. É o caso da maria-cavaleira-do-rabo-enferrujado, ou do anambé-branco-de-bochecha-parda. Todas as aves podem ser discretas, mas sempre existem outras por perto que tentam roubar a cena.

A coroação de um símbolo

Estudar o comportamento das aves e identificar espécies faz parte do trabalho da bióloga Maria Antonieta Pivatto. Foi dela a idéia de eleger uma ave símbolo em Bonito. A escolhida foi o udu-de-coroa-azul. Além das penas da cauda em forma de espátula, ele também atrai o olhar dos observadores pela variedade de cores. "Isso vai ajudar a incrementar o turismo de observação de aves em Bonito e na região?”.

“Com certeza. A gente ter uma ave-símbolo já é o primeiro passo, porque as pessoas começam a associar uma cidade com uma ave. Aí essa ave vai trazer os observadores pra cá. Não só interessados em observá-la, mas também em conhecer todas as outras espécies que nós temos na região”.

Rico em diversidade, o Planalto da Bodoquena já tem cerca de 400 espécies identificadas. Uma região com grande potencial para o turismo de observação de aves. "Praticamente todos os sítios turísticos tem aves interessantes e ainda nós temos o Parque Nacional da Serra da Bodoquena, que não está aberto ao público, mas assim que ele tiver visitação liberada, vai ser o grande atrativo”.

Na “Boca da Onça”

Chegar aos atrativos nesta região do Mato Grosso do Sul costuma ser uma aventura. Nosso destino é a fazenda Boca da Onça, distante 55 quilômetros de Bonito. Viemos a procura de uma das mais belas aves da fauna brasileira, o urubu-rei. Deixamos o carro e seguimos a pé. A caminhada pela trilha é rápida e nos leva a um local onde ele é muito avistado, a garganta da cachoeira Boca da Onça. Logo de cara, bom sinal. Encontramos urubus, mas não exatamente da espécie que gostaríamos. Estes são todos escuros, bem diferentes do urubu-rei.

Quem vem aqui, porém, não se contenta apenas em observar a cachoeira de cima. Para ver toda a beleza desse cenário, é preciso encarar uma grande aventura: a única maneira de avistar a queda d'água é lá de baixo e a forma mais rápida pra chegarmos lá é de rapel. Colocamos o equipamento de segurança, mas antes, o instrutor ainda dá algumas recomendações. Aberto o alçapão, ficamos diante de um abismo. Noventa metros nos separam do chão. Cercado por tanta beleza fica difícil saber para onde olhar. Abaixo, está o rio Salobra. Do outro lado, o Parque Nacional da Serra da Bodoquena. A reserva abrange uma área de 76 mil hectares e está em fase de regularização.

Da tensão inicial, à curtição, bastam alguns minutos. A plataforma começa a ficar pequena, sinal de que a nossa descida está chegando ao fim. Terminado o rapel, ainda é preciso descer a pé o restante do trajeto. Escadarias nos levam até a base da cachoeira. São 160 metros de queda, a maior cachoeira do Mato Grosso do Sul. Ali descobrimos porque ela se chama Boca da Onça. A resposta está na cavidade da rocha semelhante a uma boca de onça.

Na hora certa, no lugar certo

Apesar da beleza do lugar, nem sinal do urubu-rei. Mas a natureza é caprichosa, proporcionou um encontro com ele três dias depois, às margens do rio Miranda. Soberano, revela toda a exuberância para quem passa. Não só pelas cores, mas também pelo tamanho. Mesmo assim, o maior urubu brasileiro é vulnerável. O único afetado pela destruição do habitat e também cobiçado por traficantes de animais. Avistá-lo ali é certeza de que a região de Bonito está bem preservada. Nesse recanto de vida selvagem, as aves podem se exibir sem medo de serem capturadas.

O que os olhos vêem, nem sempre é o que a natureza tem pra mostrar. Às vezes, a revelação é tão sutil que requer mais do que um olhar atento. É tão rápido, que é preciso estar no lugar certo, na hora certa. Insetos fazem parte do cardápio da ariramba-de-cauda-ruiva, também conhecida como bico de agulha. Ela devora uma borboleta em poucos segundos. Apetite de quem acabou de despertar e terá um longo dia pela frente. A gralha picassa procura o café da manhã no tronco da árvore e se esforça para garantir a refeição. Na região de Bonito, tanto a comida como as casas das aves podem estar nos lugares mais surpreendentes.

Às araras o que é delas

Um refúgio muito procurado pelas aves no planalto da Bodoquena é o buraco das araras. Elas são as principais moradoras desta cavidade natural provocada pelo desmoronamento do subsolo. A dolina, nome dado a este tipo de formação geológica, tem 160 metros de diâmetro, 100 de profundidade e é cercada por vegetação de cerrado. Um lugar perfeito para abrigar as aves. A cada revoada, um novo espetáculo. O show não tem hora pra acontecer. Mas a chance de vê-lo é maior no começo da manhã e no fim da tarde. O descanso é nas árvores ao redor do buraco, ou nas fendas que existem nos paredões de rocha. Locais que também podem ser usados para fazer ninhos. Mas não é só na época de procriação, que vai de junho a dezembro, que os casais são vistos juntos. As araras, a exemplo de outros psitacídeos, são animais fiéis. Pular só se for de um galho para o outro e ainda assim pra ficar mais perto da parceira. Quando as araras se aproximam, nunca falta carinho. Elas chegam a passar horas assim. Trocam carícias sem se importar com os olhares indiscretos dos visitantes.

Demonstrações de amor que só encantam visitantes graças ao empenho de Modesto Sampaio, de 68 anos, o dono da fazenda onde fica um dos maiores atrativos do município de Jardim. Quando comprou a área de 100 hectares, há 18 anos, o buraco das araras era um lixão. Devido ao livre acesso, qualquer pessoa podia jogar o que bem entendesse buraco abaixo. Hoje, o que chama a atenção no fundo do buraco são cinco jacarés-de-papo-amarelo. Como eles foram parar lá embaixo, é um mistério.

De lixão para santuário

Seu Modesto nos conta que muita gente já morreu aqui. Até os anos 60, esta era uma terra de ninguém, onde se fazia justiça com as próprias mãos. Transformar um depósito de lixo e de ossadas humanas num santuário natural foi tarefa de anos. As araras haviam sumido da dolina, espantadas pelos intrusos. Como trazê-las de volta? Essa era a pergunta que seu modesto mais se fazia. Hoje, vivem no buraco cerca de 30 casais de araras vermelhas. Para atraí-las de volta, foi necessário também um trabalho de recuperação ambiental da vegetação.

Desde então, tem sido feito o reflorestamento de áreas ao redor da dolina, transformada há dois anos em RPPN, reserva particular do patrimônio natural. A bióloga Maria Antonieta Pivatto coordenou o plano de manejo da reserva e o considera um modelo. Um levantamento feito pela bióloga já identificou, na reserva, 125 espécies de aves. Elas atraem centenas de visitantes pra cá todos os anos. Plantada por seu modesto, a semente do ecoturismo cresce sem parar e o enche de satisfação.

Nas margens do rio Miranda

Estamos numa região do município de Bonito muito procurada pelos pescadores esportivos. Não é preciso percorrer grandes distâncias para encontrar bons pontos de pesca. Descemos o rio atrás de alguns deles. Durante a estiagem, o Miranda oferece muitas opções de locais para atracar o barco. Lugares perfeitos para nossos arremessos.

Vamos partir pra pesca do dourado. A modalidade mais comum neste trecho do Miranda é a pesca desembarcada, no meio das pedras ou nas praias. O momento é muito propício porque o rio está bastante baixo. Essa é única maneira para se pegar o dourado nesses tempos.

Os primeiros arremessos não são bem sucedidos. A corredeira é boa, mas nada de peixe na linha. Seguimos mais adiante no rio e encontramos uma praia ideal: deserta e com bastante espaço. É um ótimo exercício. Nesse vai-e-vem na areia é que nossa pescaria começa pra valer. O rei do rio é brigador. Usamos um anzol 7/0 e jejum de isca. Uma isca atraente é importante, mas não garante sozinho o sucesso da pescaria.

Supresas na pescaria

Vamos atrás de outras corredeiras. Às vezes, o melhor lugar para a pescaria está no meio do rio. Neste caso, não basta só um bom arremesso, a técnica também é fundamental.

Toda pescaria sempre traz alguma surpresa. Em outro ponto do rio, Marcelo Gomes, pescador profissional, se surpreende com um Pacu fisgando a linha. O melhor, porém, estava reservado para o último dia. Atracamos no mesmo lugar onde mais bateu peixe, na véspera, e novamente não falha.

A pescaria vira festa. Dourados de diferentes tamanhos, mas que proporcionam sempre a mesma emoção. Alguns anos atrás era difícil fisgar dourados grandes aqui. Com as restrições à pesca no rio Miranda, os peixes têm crescido mais. Quando se trata de uma espécie tão esportiva, o desejo é que essa tendência não mude. Assim, a próxima pescaria pode ser ainda mais empolgante que a anterior.

Fonte: Terra da Gente

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